Vander Costa assume a presidência do Sistema CNT
A CNT, o ITL e o SEST SENAT estão sob nova batuta. O empresário mineiro do transporte de cargas Vander Costa – eleito em fevereiro, por unanimidade, pelo Conselho de Representantes da CNT – toma posse nesta quinta-feira (21), em Brasilia (DF), para comandar as entidades pelos próximos quatro anos. Vander Costa respira o transporte desde a infância e, agora, vive a expectativa de estar à frente dessas instituições e de tocar o legado do presidente Clésio Andrade. Preparado, ele tem clara a ideia de que a rota para o Brasil inaugurar uma nova era de desenvolvimento, geração de empregos e distribuição de riquezas passa, invariavelmente, pelo investimento em infraestrutura. “A CNT tem papel estratégico na formatação desses projetos e no convencimento dos governantes”, diz ele.
Para destravar, no curto prazo, os investimentos na área, o novo presidente fala da necessidade de “abrir os caminhos para a maior participação do setor privado” e de haver uma regulação responsável. “Se quisermos atrair investidores, precisamos expor, de maneira clara e objetiva, as regras do jogo, garantindo segurança jurídica”, afirma. Costa também não vê com bons olhos o atual modelo de outorgas praticado nas concessões do transporte, com altos valores, o que, na visão dele, onera as operações e atrasa o desenvolvimento econômico.
Sobre a inédita atmosfera política por que passa o país, Costa considera acertada a agenda reformista encampada pelo governo Bolsonaro, com a reforma da Previdência na linha de frente, mas critica a marginalização da política enquanto instrumento de uma democracia representativa. Ele entende que velhos e viciados hábitos decorrentes do presidencialismo de coalizão devam ser suprimidos, porém, defende o diálogo permanente com todos os setores para se chegar aos melhores denominadores comuns.
Na conversa a seguir, Vander Costa endossa a relevância social do SEST SENAT como indutor da melhoria da qualidade de vida do trabalhador do transporte e do ITL na preparação de lideranças para a vanguarda do transporte.
Ao longo de toda a sua vida pessoal e profissional, como o senhor definiria sua relação com o transporte?
Eu tenho uma relação forte com o transporte desde muito pequeno. Meu pai começou a dirigir caminhão ainda nos anos 1940. Quando nasci, em 1962, ele já era um empresário do transporte de cargas. Minhas primeiras lembranças, quando eu morava em Araxá (MG), eram com os caminhões e os passeios que a gente fazia neles. Durante toda a minha vida, estive ligado ao caminhão, à carga, à estrada. Comecei a trabalhar com 14 anos em uma empresa de transporte da qual o meu pai era sócio e, em 1982, fundamos a nossa própria empresa, a Vic. Desde então, venho trabalhando como gestor dessa empresa. Também, desde muito cedo, ingressei na vida sindical. Fui diretor e presidente do Setcemg (Sindicato das Empresas de Transportes de Carga do Estado de Minas Gerais) e da Fetcemg (Federação das Empresas de Transportes de Carga do Estado de Minas Gerais). Então, no setor de transporte, eu já tenho uma experiência de algumas décadas de atuação.
Qual a sua expectativa para o início dos trabalhos como presidente da CNT, do ITL e dos Conselhos Nacionais do SEST e do SENAT?
A minha expectativa é bastante positiva. Eu me sinto preparado, pela experiência que acumulei como gestor de empresa e dirigente sindical, a exercer essa nova função e continuar o trabalho que vinha sendo encabeçado pelo presidente Clésio Andrade. Por conhecer o trabalho dele à frente da CNT e na criação do SEST SENAT e do ITL, é um grande desafio continuar sua obra. Mas também tenho a tranquilidade de já pegar um setor consolidado. São instituições constituídas, atuantes, com equipes formadas por profissionais competentes, com alta capacidade técnica, que já têm conhecimento do trabalho que desenvolvem. A estrutura está pronta para avançarmos e continuarmos no caminho do desenvolvimento. Daremos continuidade ao trabalho que está sendo desenvolvido e estaremos sempre atentos para modernizar, ouvindo e atendendo aos anseios dos transportadores de todos os modais.
Quais serão as principais agendas das instituições nesse novo ciclo?
A CNT tem um papel importante na formatação de projetos de infraestrutura no Brasil. Se o Brasil quiser crescer – e todo brasileiro quer que o país cresça – e tiver mais possibilidade de distribuição de renda, nós não precisaremos reinventar a roda. Precisaremos olhar para o mundo e para onde o crescimento está acontecendo. Houve crescimento em países que investiram em educação e infraestrutura. Os tigres asiáticos cresceram pela educação de alto nível; e a China e a Índia, pela infraestrutura. E quando falamos de infraestrutura, nos referimos a todas as áreas: transporte, saneamento, telecomunicações. O papel da CNT é também o de convencer os governantes de que investir em infraestrutura é preparar o Brasil para o crescimento. A função do SEST SENAT é capacitar a mão de obra para esse crescimento. Há pouco tempo, quando a economia estava aquecida, em 2013 e 2014, as empresas conviveram com a falta de mão de obra qualificada. Então, precisamos continuar trabalhando para oferecer treinamento especializado. Além disso, tem a parte de promoção da saúde, que é fundamental. Um trabalhador produtivo é mais feliz e saudável. O ITL, por sua vez, tem como objetivo ampliar a especialização na gestão das empresas. Convivemos em um setor ainda com empresas formadas e geridas sem muito conhecimento acadêmico e técnico da área. Por isso, é fundamental dar continuidade aos programas desenvolvidos com reconhecidas instituições nacionais e internacionais, de modo a permitir que o empresário domine a técnica de empreender e esteja sempre atento ao que está acontecendo no mundo.
O Brasil ensaia uma recuperação econômica – após uma longa recessão que impactou diretamente a atividade transportadora – e tem um novo governo, com uma agenda reformista e pretensamente dissociada de dogmas clássicos da política brasileira. Que leitura o senhor faz deste momento do país?
Na minha visão, é correta a agenda reformista, mas é equivocada essa ideia de dissociá-la da política clássica. O Brasil é um país democrático e, se estamos em uma democracia, precisamos ter a política funcionando. O Executivo não faz tudo sozinho. É equivocado pensar que o Executivo, por ter sido eleito pelo voto da população, vai fazer tudo sem o apoio do Legislativo. Quebrar com algumas práticas viciadas do chamado presidencialismo de coalizão é correto, mas não dialogar é equivocado. E o governo Bolsonaro, nesse pouco tempo de atuação, tem conversado pouco sobre projetos, propostas e ideias. Existem muitos analistas que, antes de o Congresso tomar posse, diziam que as reformas já estavam aprovadas. Eu torço para que a da Previdência seja aprovada, e vamos trabalhar da maneira que for necessária para convencer o legislativo dessa importância. Por isso, eu falo que se afastar da política não é a atitude correta. É preciso fazer sim uma política diferente, baseada na conversa, no convencimento. Trazer a sociedade para esse diálogo também é essencial.
Considera acertada essa pauta inicial do governo mais focada na Reforma da Previdência (com vistas ao saneamento das contas públicas), na desburocratização de processos e em medidas para combater a insegurança nas cidades e a corrupção? Por quê?
O governo acerta, sim. A reforma da Previdência, a meu ver, não tem muita opção. Sem ela, o governo não tem como pagar os aposentados. A segurança também é fundamental. Ela está frágil, e essa foi a bandeira do governo eleito durante a campanha. Os projetos enviados pelo ministro Sérgio Moro ao Congresso estão corretos, apesar de ter alguns pontos que não compreendemos ainda. Um deles é o veto do presidente Bolsonaro ao aspecto do combate ao roubo de cargas, que tratava da cassação do CNPJ do receptador da mercadoria roubada. Nós, transportadores, consideramos que esse item é fundamental para combater esse crime com uma severa punição ao receptador.
O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes, afirmou que a receita para destravar os investimentos em infraestrutura é “eliminar regulação”, pois quem dá a solução é o setor privado. O senhor acha que esse é o caminho?
Abrir os caminhos para a maior participação do setor privado é, sim, imprescindível. Mas, em relação à regulação, é preciso ser cauteloso. Precisamos de uma regulação clara. O que afasta o capital privado é a falta de normas claras, transparentes. Precisamos eliminar entraves, e não regulação. Se quisermos atrair investidores, precisamos expor, de maneira clara e objetiva, as regras do jogo, garantindo a segurança jurídica.
Quais medidas o governo precisa tomar, de imediato, para que o setor privado possa contribuir mais para a melhoria do transporte brasileiro?
É importante eliminar as outorgas, ou baixar seus valores, para poder prover o investimento em infraestrutura de transporte e garantir sua sobrevivência. Por exemplo, nos leilões dos aeroportos, esse dispositivo foi um alívio para o caixa do governo, mas hoje é um problema para a população. Os preços subiram muito nos terminais, e o movimento não é tão grande. Por que é caro o cafezinho do aeroporto? Porque existe outorga e, para pagar esse valor, o administrador precisa cobrar caro o valor do aluguel de quem vai explorar o ponto do comércio. O mesmo acontece com as rodovias. Outorgas altas significam pedágio caro. A consequência disso é a elevação dos custos do transporte, o que retarda o desenvolvimento econômico. A outorga é perversa para a sociedade brasileira; ela resolve os problemas de caixa no dia do leilão, e não no longo prazo.
Sob essa perspectiva, em quais bases está sendo estruturada a relação da CNT com o novo governo e com essa nova configuração do Executivo federal e da política como um todo?
Estamos realizando diversas reuniões com os órgãos do governo. Sabemos que os ministros estão bastante envolvidos na formulação de projetos nesse início, organizando a casa. Mas estamos mantendo um diálogo para colocar nossas ideias. Nesses dois meses, as reuniões não aconteceram na proporção que esperávamos, mas entendemos que o governo ainda está se estruturando. Estamos bastante otimistas e vamos desenvolver nosso trabalho junto ao Executivo e ao Legislativo para apresentar nossas propostas naquele trabalho incansável de convencimento de que o melhor caminho para o Brasil se desenvolver é investir em infraestrutura.
À luz dos cada vez mais urgentes avanços tecnológicos e da premente necessidade de formação profissional, como o senhor vê o futuro do transporte? Do que o Brasil precisa para acompanhar essas transformações?
Mudanças sempre existirão, e precisamos estar abertos a elas. Se analisarmos o transporte de cargas desde a década de 1960, ele mudou muito e vai continuar mudando. Mas, independentemente das transformações, o transporte vai continuar sendo necessário. Já contamos com grandes e novas transformações tecnológicas, mas, ao contrário do que muitos acreditam, não aposto no fim dos veículos. O drone, hoje, já é uma realidade. Isso é uma evolução, porém, não realizaremos todo o transporte de cargas por esse equipamento. Até mesmo porque, se isso acontecer, transferiremos os problemas das rodovias para o céu. A tecnologia vem para dar mais segurança e mais mobilidade e reduzir custos. Teremos uma mudança da matriz energética, com a substituição dos combustíveis fósseis por outros renováveis.
A CNT, o SEST SENAT e o ITL estão preparados para essa nova conjuntura, isto é, para o futuro?
Estamos preparados e, também, estamos nos aperfeiçoando. Isso precisa ser algo contínuo. Com as mudanças que já temos hoje, conseguimos nos adaptar e atender às demandas atuais do setor. Além disso, iniciamos um movimento para compreender melhor tudo o que está acontecendo. Temos feito diversas missões internacionais para acompanhar como estão as pesquisas e o desenvolvimento desse novo cenário. Esse é um trabalho que precisa ser constante. Estamos atentos a ele.
O SEST SENAT tem como missão transformar a realidade do transporte brasileiro e começa 2019 com um novo planejamento estratégico. Ao longo da sua trajetória no setor de transporte, o senhor presenciou e participou diretamente da atuação da instituição. Que avaliação faz desse trabalho?
O trabalho do SEST SENAT é vitorioso. A criação foi coordenada pelo presidente Clésio Andrade e contou com a participação de empresários do transporte. Foram os líderes do transporte que comandaram esse processo. Eles sonharam e viram esse sonho se tornar realidade. Na minha visão, o SEST SENAT cumpre o seu papel e tem se preparado para desempenhar novas funções que acompanhem a evolução do transporte.
O Sistema S vive a ameaça de um possível corte na arrecadação de recursos, o que, se for concretizado, poderá afetar os serviços prestados aos trabalhadores do transporte e à sociedade. Qual é o principal argumento para sustentar que o SEST SENAT não deva passar por esse corte?
O trabalho que realizamos. Toda a arrecadação destinada à manutenção dos nossos serviços é aplicada e revertida em melhorias para a vida do trabalhador do transporte. Os números mostram e comprovam isso. E é importante darmos ênfase nisso. Se houver cortes no Sistema S, tira-se do trabalhador para beneficiar as médias e grandes empresas. O ganho do empresário nesse cenário é ter mão de obra de qualidade, com profissionais capacitados, que geram mais produtividade. É um grande equívoco achar que um empresário vai contratar mais pessoas porque houve um corte de 1% ou 1,5% no gasto da empresa. Empresário nenhum contrata mão de obra porque vai ter redução de custos. A contratação só acontece quando há crescimento econômico. Além disso, o que tem sido veiculado na imprensa sobre falta de transparência ou desvio de recursos do Sistema S não nos atinge. As contas do SEST SENAT estão todas aprovadas pelos órgãos de controle. Temos auditorias internas e uma área de Compliance que nos garantem cada vez mais uma gestão clara e transparente. O nosso trabalho é no sentido de, diante de alguma ressalva ou discordância, apurar o fato e corrigir o problema. Temos uma sala no Departamento Executivo do SEST SENAT onde expomos todo o nosso trabalho, com os valores arrecadados e os serviços realizados.
O senhor tem um sonho?
Eu tenho o sonho de ver e de viver em um Brasil melhor, onde as pessoas se respeitem mais e andem com mais segurança. Um sonho de que cada pessoa passe a entender que o direito dela vai até onde começa o direito do outro. Temos previstos na Constituição direitos e deveres. Para mim, o principal dever a ser cumprido é aquele de respeitar o próximo, respeitar a pessoa que está ao meu lado.
Qual mensagem o senhor gostaria de transmitir a todos os transportadores do Brasil?
Eu convido a todos os transportadores do Brasil a atuarem de maneira conjunta pela melhoria do setor. Se organizem em suas bases, em seus sindicatos, em suas federações, em suas associações e nos tragam as demandas. Estamos abertos para receber essas propostas e trabalhar para atender aos anseios do setor e torná-lo cada vez mais competitivo. Estejam certos de que sempre poderão contar conosco nessa grande missão.