Livro traz abordagem inédita da relação entre transporte e energia


Trabalho foi elaborado pelo professor do Programa de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ, Márcio de Almeida D’Agosto

Ao ministrar aulas em uma disciplina sobre transporte, engenharia e meio ambiente, o professor do Programa de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ Márcio de Almeida D’Agosto se deparou com a falta de bibliografia que reunisse informações sobre o tema. Passou a trabalhar, então, no desenvolvimento de um livro que foi lançado neste ano pela editora Elsevier. “Transporte, uso de energia e impactos ambientais”, preenche, assim, uma lacuna na formação de engenheiros e mostra diretrizes para um planejamento eficiente de consumo de energia no setor.

Em entrevista à Agência CNT de Notícias, o professor, que também é membro do Niet (Núcleo de Inteligência e Estratégia em Transporte ), instância de assessoramento do Sest Senat e do ITL (Instituto de Transporte e Logística) falou sobre a publicação. Como é a abordagem dos impactos ambientais provocados pelo transporte no livro? Ele tem uma abordagem didática porque surgiu como referência para uma disciplina que existe no curso de Engenharia Ambiental, que é Transporte, Engenharia e Meio Ambiente. Então, tem uma visão básica de transporte e como ele se relaciona com o uso de recursos naturais. Mas ele também pode ser utilizado na formação em nível tecnólogo e técnico, além de aprofundar a abordagem e para um mestrado, por exemplo. É o único livro, no Brasil, que trata do tema. E quando você fala de sustentabilidade ambiental, todo mundo sabe que é importante. Mas na hora de definir o que fazer, as propostas são desconexas, muitas vezes por falta de informação técnica. capa livro.jpgEsses impactos ocorrem desde a implantação até a operação... O livro mostra como a atividade está relacionada à emissão poluentes atmosféricos, gases do efeito estufa, ruído, vibração, geração de efluentes líquidos e sólidos. E tratamos disso tanto na fase da construção, que seria a implantação de infraestrutura para transporte, quanto na de operação, que é mais detalhada. Quando você fala de implantação, tem impactos característicos de grandes obras de infraestrutura, como pontes, rodovias, portos e aeroportos. Mas isso é por um período menor do que o que a estrutura vai viver. Então, você passa três anos construindo e um tempo indefinido operando. A operação, a longo prazo, causa impactos acumulados. Até porque o transporte utiliza basicamente petróleo como recurso de energia, que é uma fonte não-renovável. A preocupação com a eficiência energética é uma pauta que deve estar no centro do debate para todos os modais? Com certeza. Mas existe uma diferença grande entre a eficiência energética nos modos ferroviário ou aquaviário do rodoviário. Se você comparar, por exemplo, o consumo médio de energia em ferrovias e hidrovias por tonelada-quilômetro ou por passageiro-quilômetro, o rodoviário consome 10 vezes mais. Então, esse modal é de oito a 10 vezes menos eficiente em termos de energia que o ferroviário e o aquaviário. E eu não estou falando de transporte aéreo, que é pior, já que para manter o avião no ar gasta-se mais energia. O que acontece é que, embora tenha que se tratar da eficiência de todos os modos, o que de fato tem uma urgência para equacionar o problema é o rodoviário. Porque consome muita energia, derivada do petróleo, não renovável. Como aumentar a eficiência energética do transporte rodoviário? Tirando do transporte do rodoviário e mandando para outros modos. Ou melhorando a tecnologia que já existe, como os motores, os sistemas de transmissão, o projeto dos veículos, para que sejam mais leves e capazes de gerar energia. Mas tem um limite, ou seja, você pode alcançar uma melhora de 25% a 30% da realidade que se tem hoje. Depois, tem que saltar o degrau, ir para outra tecnologia, como propulsão híbrida ou veículos elétricos. Mas melhorar mais o rodoviário é menos eficiente em termos de energia do que você transferir a carga para outros modos, de maior capacidade, como ferroviário e aquaviário. Isso também é uma questão de política pública. Como o Brasil vem tratando disso? Estamos fazendo muito pouco. Trata-se de colocar em prática soluções que já são conhecidas. E aí não tem muito jeito: tem que buscar recurso onde quer que esteja e implementar. Utilizar transporte marítimo, contêineres – que podem transportar carga geral e são fáceis de manusear -, transporte público de massa, ferroviário, eletrificado, de grande capacidade para cargas e passageiros. Entre as atividades econômicas, qual o peso do transporte para impactos no meio ambiente? O Brasil é o país que mais usa biocombustível no mundo, mais ou menos 17%. Nos que mais se aproximam, os biocombustíveis representam 2%. Nesse contexto, a média mundial é a seguinte: um terço é responsabilidade da indústria, um terço é do transporte e um terço são outras atividades, como comercial residencial.

A questão é que a indústria tem sucedâneos, que permitem a emissão de menos dióxido, como energia elétrica de fonte renovável ou gás natural, que polui menos. Lembrando que, no mundo, a indústria usa carvão, gás e óleo. No Brasil é que o predomínio da energia utilizada é de hidrelétricas. Já o transporte depende fortemente de petróleo e vai continuar dependendo, porque, em alguns casos, não há substituo. Assim, deve-se apostar na multimodalidade, e transferir do rodoviário para outros modos. Mas também tem que ter matriz elétrica limpa. Nas cidades onde não tem indústria, o transporte é o maior emissor de poluentes atmosféricos, porque tem centenas de milhares de motores funcionando e jogando poluição. Daí a necessidade de se investir em transporte de massa e de baixa emissão de carbono e desenvolver estratégias que aumentem a eficiência energética do setor.

Fonte: Agência CNT de Notícias