Transporte rodoviário eleva custos
Especialistas apontam deficiência do agronegócio brasileiro e opções mais racionais de transporte, como ferrovias e hidrovias
O engenheiro agrônomo Thiago Péra, coordenador do grupo EsalqLog, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (USP), em Piracicaba (SP), especializada no cálculo de fretes rodoviários, confirma a tese de que o preço do frete no Estado de Mato Grosso, o maior produtor de soja e algodão do País e o segundo maior produtor de milho, seja um dos mais caros do mundo. "Isso porque o escoamento da safra está baseado principalmente no modal rodoviário", diz Péra, acrescentando que o valor do transporte da tonelada de soja para Santos, por exemplo, sofreu variação de mais de 100% em cinco safras, de 2009 para cá (Veja gráfico).
Nos EUA. Péra compara a situação do sojicultor mato-grossense à do sojicultor norte-americano. "Para exportar soja do norte de Mato Grosso para Xangai, na China, o sojicultor desembolsou US$ 160 por tonelada, na média de 2013", diz Péra. "Já a soja que sai de Mineápolis, no Centro-Leste dos Estados Unidos, requer bem menos: US$ 96 por tonelada", continua ele, acrescentando que aí se considera todo o frete rodoviário, hidroviário, ferroviário e marítimo até o Porto de Xangai. "E o que é interessante notar? É que, somados os custos de todos os modais, a parte do transporte rodoviário em Mato Grosso representa 68% do total, enquanto, nos Estados Unidos, apenas 12%, provando, mais uma vez, como os outros modais - ferrovia e hidrovia - são muito mais econômicos para grãos."
Embora Péra considere, apesar do preço mais alto, o modal rodoviário bastante útil, reconhece que, para grandes distâncias, não é o ideal. "E ainda temos, infelizmente, uma utilização muito forte deste modal", enfatiza ele, acrescentando que, além da infraestrutura logística deficientes, falta também uma gestão adequada do portfólio de transportes. "E como seria essa gestão governamental? São, por exemplo, bons editais de concessão e a boa regulamentação do setor de transportes", diz Péra. Ele cita como exemplo de boa regulamentação a Lei 12.619, de abril de 2012, conhecida como Lei do Caminhoneiro.
"Se num primeiro momento ela impactou o custo do frete rodoviário, no médio e longo prazos vai proporcionar maior competitividade para outros modais", diz. "Não defendo, porém, que o modal rodoviário seja ruim. Pelo contrário, é bom, tem uma flexibilidade muito grande e permite que Mato Grosso consiga escoar sua produção, apesar de toda a precariedade das estradas."
Outra boa medida, para Péra, foi o sistema de agendamento para caminhões descarregarem a safra no Porto de Santos, que começou a vigorar em janeiro deste ano. "Isso reduz filas no porto, desde que, obviamente, haja locais adequados para os veículos ficarem aguardando sua vez. Sem esses pátios, a fila simplesmente é deslocada para o local de origem dos grãos."
Longo prazo. "Isso tudo, sobre modais mais econômicos, etc., o governo já sabe e inclusive tem bons e completos planos de logística de transportes", comenta o engenheiro agrônomo Antônio Carlos Costa, gerente do Departamento de Agronegócios da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que lançou, recentemente, o Índice de Confiança do Agronegócio (IC Agro), um termômetro específico para o setor produtivo, além do Outlook Brasil 2013 - Tendências do Agronegócio, com projeções para o setor até 2023. "O problema é que mesmo que esteja trabalhando para melhorar todas as deficiências do agro, o que notamos é que não são ações integradas", diz Costa, concordando com o agrônomo da EsalqLog. "Mesmo as ações de curto prazo deveriam vislumbrar um cenário para daqui a dez anos, e não vemos isso acontecendo."
O agrônomo da Fiesp revela que, no IC Agro, uma das perguntas que foram feitas para o setor produtivo foi se os produtores acreditavam que o governo estava empenhado em investir em infraestrutura e logística principalmente para a produção agrícola. "Um total de 58,3% dos produtores não acredita que o governo brasileiro esteja realmente empenhado em resolver essas questões", comenta Costa.
Do próprio bolso. Entretanto, a mesma pesquisa indica que o produtor está disposto a investir, ele mesmo, nesses segmentos. "Um total de 35% dos produtores entrevistados disseram que investiriam em infraestrutura e logística, como armazenagem (em primeiro lugar), estradas, benfeitorias, e equipamentos de irrigação", diz Costa. "Isso mostra claramente que o setor privado está fazendo um trabalho que deveria ser prioritariamente do governo e revela, ao mesmo tempo, que, quando há uma política agrícola na direção certa, o produtor corresponde", diz Costa, referindo-se à intenção prioritária de o agricultor investir em sistemas de armazenagem. "Esta intenção detectada no IC Agro, divulgado em fevereiro deste ano, já pode ser consequência do Plano de Armazenagem, lançado pelo governo federal em julho do ano passado, no Plano de Safra 2013/2014."
Fonte: O Estado de S. Paulo