Problemas no transporte multimodal no Brasil afetam exportações


Leia a entrevista com Paulo Ferraz, presidente da Federação das Câmaras de Comércio Exterior

Este ano, o Brasil exportou, até o mês de novembro, US$ 207,6 bilhões, com redução de 5,7% em relação ao mesmo período do ano passado. As importações foram de US$ 211,8 bilhões, também apresentando redução, porém, de 3,9% neste mesmo comparativo. Os principais países de destino das exportações são: China, Estados Unidos, Argentina, Países Baixos e Alemanha. Já os principais países fornecedores ao mercado brasileiro, em 2014, são: China, Estados Unidos, Argentina, Alemanha e Nigéria. Os dados são do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

Para o presidente da FCCE (Federação das Câmaras de Comércio Exterior), Paulo Fernando Marcondes Ferraz, a concorrência externa aliada à falta de competitividade contribuem para a redução das exportações de produtos industrializados. A queda de preços das commodities exportadas pelo Brasil e a desaceleração da economia chinesa também causaram a diminuição em relação às exportações de produtos primários. Em entrevista à revista CNT Transporte Atual, ele aponta que a disparada do dólar, também responsável pela queda na importação, faz com que o consumidor deixe de comprar produtos de outros países, trazendo preocupação aos donos de importadoras, com previsão de diminuição nas vendas.
Paulo Fernando Marcondes Ferraz tem vasta experiência em comércio exterior. Ele presidiu e foi sócio de grandes empresas do setor e, também, atuou como consultor e representante de diversas companhias internacionais no Brasil. Além disso, Ferraz foi diretor-executivo da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil), presidente da Câmara de Comércio Indústria e Turismo Brasil-Grécia e é árbitro do CBMA (Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem). Veja os principais trechos da entrevista.
Quais as perspectivas para o comércio exterior do Brasil em 2015? O ano de 2015 será de importantes reajustes na economia. Fatores como eleições presidenciais, risco de recessão econômica e atual cenário inflacionário, bem como a retração dos negócios na indústria e o saldo comercial do 1º semestre de 2014 trazem um desafio ainda maior para o comércio exterior brasileiro. A projeção de crescimento desse setor em 2015 é de 4%. Se compararmos a participação brasileira no comércio mundial em 2011, que era de apenas 1,41%, no próximo ano poderá ser ainda menor, com previsão de queda para 1,15%. Quais são os principais entraves para o comércio internacional brasileiro? O primeiro passo é romper com o chamado Custo Brasil e seus problemas estruturais, burocráticos e econômicos, que comprometem a competitividade, dificultando o comércio exterior. Dessa forma, é preciso que haja mais investimento em tecnologia, preparo de mão de obra e, principalmente, inovação tecnológica. Essas resoluções só são alcançadas por meio de acordos mais amplos com outros países e de parcerias entre governos e empresários. Contudo, não são poucas as dificuldades para transpor estas barreiras. O crescimento previsto para o próximo ano, segundo o Banco Central, é de 0,8%. Isso pode prejudicar o comércio entre o Brasil e outros países? Trabalhamos com este cenário, mas também com a ampliação de mercados e a recuperação das economias internacionais que estão saindo de um cenário de crise financeira. Acreditamos que o Brasil tem potencial para encontrar boas oportunidades de negócios e, portanto, as chances de números melhores, ao final de 2015, são factíveis. Em comparação a 2013, as exportações e as importações brasileiras sofreram queda. A que se deve essa redução? A acirrada concorrência externa e a falta de competitividade da economia brasileira se destacam como fatores relevantes para a redução das exportações de produtos industrializados. Em relação às exportações de produtos primários, a principal causa de redução foi a queda de preços das commodities exportadas pelo Brasil, aliada à desaceleração da economia chinesa. Quando a China desacelera, o mundo desacelera. Não é culpa apenas do Brasil. Além disso, o baixo crescimento da União Europeia afetou diretamente países exportadores da América Latina, como o Brasil. Nesse aspecto, vale ressaltar que 19% das exportações brasileiras vão para a União Europeia. O dólar tem apresentado comportamento atípico, chegando a patamares superiores a R$ 2,60. De que maneira isso pode impactar a corrente de comércio exterior? A alta do dólar acarreta, logo de cara, o aumento do custo de produção. Em longo prazo, além de estimular a competitividade, mostra-se positiva às exportações, estimulando principalmente a produção de matéria-prima nacional. É paradoxal, mas, no fim, para o exportador, o dólar mais alto ajuda no recebimento de divisas. A desvalorização do real influencia a receita de vendas dos exportadores, que, observando a tendência apontada em relação ao comportamento da moeda americana, já amplia as estratégias de exportação para o ano que vem. Contudo, em movimento contrário, a disparada do dólar faz com que o consumidor deixe de comprar produtos importados, trazendo preocupação aos donos de importadoras, com previsão de diminuição nas vendas. Qual a prioridade para o crescimento do comércio exterior? Em um cenário de ampliação da abertura comercial, é claramente preciso melhorar os serviços de infraestrutura, o que vai diretamente resultar em um efeito positivo sobre os ganhos de comércio. Além disso, o Brasil precisa considerar uma inequívoca inovação tecnológica, visando diversificar sua pauta de exportação e proporcionando a venda de produtos de alto valor agregado. O Plano CNT de Transporte e Logística aponta a necessidade de investimentos de quase R$ 1 trilhão no setor de transporte. Em 2013, foram pagos R$ 13,5 bilhões. Por que o Brasil investe pouco? O Brasil investe menos do que deveria em logística. O baixo investimento nesse setor se torna latente ao compararmos, por exemplo, o Brasil aos Estados Unidos. Os norte-americanos aplicam 7,7% do seu Produto Interno Bruto em transportes, enquanto o Brasil investe somente 0,6% do PIB. Essa discrepância nos coloca em situação desfavorável em relação à competitividade frente aos demais países. Em 2013, apenas 34% do total previsto para o setor de transportes foi efetivamente aplicado. O Brasil busca investimentos privados em transporte. Isso pode ter algum reflexo positivo para o incremento do comércio exterior? As parcerias com o setor privado favorecem o investimento em infraestrutura de transportes, à medida que o poder público não possui total capacidade de oferecer todo investimento que hoje se torna necessário para mudar a realidade logística brasileira. Essa relação tem reflexo positivo no desenvolvimento do comércio exterior, pois o governo não dispõe de todos os recursos necessários para mudar a realidade logística do país. As Parcerias Público-Privadas fornecem mais possibilidade de investimento, em menor prazo. Dessa forma, ao melhorar as condições de transporte, diminui-se o tempo e os gastos com traslado dos produtos, aumentando a atratividade nesse setor. De acordo com o Fórum Econômico Mundial, o Brasil ocupa as piores posições em relação à qualidade de ferrovias, portos, rodovias e transporte aéreo. Quais os impactos dessa deficiência para a cadeia produtiva nacional? A movimentação da economia de um país é extremamente ligada à sua capacidade de gerir bem seu sistema de transporte. É esse sistema que irá conduzir as matérias-primas até as indústrias e os produtos até os consumidores, viabilizando os outros setores da economia. Os sérios problemas do Brasil em relação à infraestrutura, como a baixa densidade das malhas ferroviária e rodoviária, acarretam, por exemplo, em custos superiores aos gastos de indústrias em países com melhor infraestrutura. Isso porque aumentam-se os gastos no deslocamento da produção, além de possíveis prejuízos por avarias no transporte. Dessa forma, a infraestrutura brasileira é uma limitação para a expansão da cadeia produtiva nacional. De que maneira deve haver a integração entre os modais de transporte para facilitar o escoamento da produção pelo setor? A integração entre os modos rodoviário, ferroviário e hidroviário acarretaria no menor custo de transporte e na redução do tempo de trânsito dos produtos, proporcionando melhor serviço, sem muitos prejuízos com eventuais avarias. Entretanto, o desenvolvimento do transporte multimodal ainda enfrenta problemas no país, principalmente em relação à legislação e à tributação. A infraestrutura portuária nacional é suficiente para atender à demanda do comércio exterior? Os portos brasileiros enfrentam o problema de falta de infraestrutura e de barreiras alfandegárias. Em 2013, foi realizada uma alteração na legislação portuária, com objetivo de modernizar os terminais, ampliando investimentos privados e facilitando a construção de portos. Contudo, deve-se ter consciência de que é necessário planejar logísticas eficientes, que reduzam os custos de transporte e que atendam às demandas do comércio. De que maneira o excesso de burocracia nos portos impacta o comércio exterior? A burocracia é, de fato, um entrave para o comércio exterior. Se compararmos o Brasil aos Estados Unidos, o outro extremo da ponta, em relação ao tempo de liberação de mercadorias, por exemplo, os norte-americanos levam até 24 horas para a liberação, enquanto aqui, leva-se, em média, sete dias. A redução da burocracia diminuiria o tempo de trânsito das mercadorias e cairia o preço do produto final, beneficiando o comércio. Existe alguma possibilidade de incremento do comércio exterior a partir do setor aéreo? No Brasil, aproximadamente 1% das mercadorias é transportada por aviões. São produtos que precisam chegar com urgência aos seus destinos. Infelizmente, a burocracia faz com que a liberação demore mais de uma semana para ocorrer. Em aeroportos dos Estados Unidos, por exemplo, essa espera cai para apenas seis horas. A solução seria aumentar o horário de funcionamento das autoridades que liberam esses produtos, já que atualmente, alguns departamentos trabalham apenas seis horas por dia. Se essas adequações fossem feitas, o preço do produto final cairia, bem como as horas gastas e eventuais perdas e, consequentemente, o comércio exterior seria beneficiado. O agronegócio ocupa o primeiro lugar na pauta de exportação do país. O que falta para que outros produtos ganhem força? Para o futuro, esse cenário é ainda mais promissor. As exportações de carnes, por exemplo, devem aumentar ainda mais o ritmo, devido à maior abertura e aos contratos firmados com grandes importadores. Contudo, outros produtos precisam, além de mercado consumidor, mais investimentos em tecnologia para se equiparem aos demais países exportadores. Se o Brasil perceber a importância de melhorar o desenvolvimento de produtos com maior valor agregado, outros setores tendem a ganhar força. Que tipo de produto tem maior potencial para ser exportado, além do agronegócio e dos minérios? Não há dúvida de que continuaremos sendo fazendas para os chineses. Manteremos a exportação de soja e carne por muitas décadas, mas precisamos abrir caminho para que vestuários, produtos químicos, tecnologia ligada a etanol, fármacos, tecnologia aeronáutica e determinados segmentos de máquinas e equipamentos brasileiros ganham espaço no mercado chinês. A China é o principal parceiro comercial do Brasil. Quais as novas oportunidades para fortalecer esse comércio bilateral? Essa parceria poderá trazer grandes investimentos ao nosso país. A China está disposta a expandir os negócios para setores industriais, de automóveis e de alta tecnologia. Só em 2012, o acordo entre os dois países alcançou cerca de US$ 75 bilhões. A expectativa é de mais investimentos chineses que possibilitem avanços na infraestrutura brasileira. Em relação às exportações, com a suspensão do embargo a produtos brasileiros, o Brasil pretende aumentar principalmente o comércio de carne, avançando para US$ 1,2 bilhão em 2015.

Fonte: Agência CNT de Notícias