Operação de ferrovia que liga Minas à Bahia depende de composição com o governo federal


Os termos da renovação antecipada da concessão da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA) preocupam a Comissão de Transporte, Comunicação e Obras Públicas, em especial pela previsão de devolução de trechos como o de Corinto, em Minas Gerais, ao Porto de Aratu, nas imediações de Salvador (BA).

Em audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta terça-feira (17/9/24), deputados, prefeitos e outras lideranças cobraram a manutenção da operação dessa linha, essencial para o escoamento da produção do Estado. O consultor da FETCEMG, Luciano Medrado, participou do debate.

Como a medida depende do aval do governo federal, foi consenso entre os convidados a necessidade de mobilização da bancada mineira no Congresso Nacional em favor da causa, sugerida pela prefeita de Contagem (Região Metropolitana de Belo Horizonte), Marília Campos (PT).

 

O trecho Corinto – Porto de Aratu é operado pela VLI Logística, controladora da Ferrovia Centro-Atlântica, que detém a concessão.

Como antecipou a deputada Ione Pinheiro (União), que solicitou a audiência, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) publicou, no final de agosto, a minuta do contrato de renovação antecipada, no qual consta que a empresa não irá mais operar esse trecho a partir de setembro de 2026 – em relação a outras linhas mineiras, a devolução, mediante pagamento de multa, já seria a partir da assinatura do novo termo.

O impacto para a economia do Estado seria enorme, atingindo empresas do porte da RHI Magnesita, líder mundial na fabricação de refratários, que poderia ter sua continuidade operacional em Contagem inviabilizada.

“Estamos tirando investimentos do Brasil por essa insegurança. As ferrovias têm uma importância logística, de segurança, por tirarem carretas das estradas, e ambiental, por emitirem menos CO2”, afirmou o presidente da RHI Magnesita na América do Sul, Wagner Sampaio.

“É uma ferrovia de grande importância, não podemos deixar ser depredada. Na Europa, na Ásia e nos EUA o mundo anda sobre trilhos, aqui o patrimônio do povo brasileiro está enferrujado”, destacou o deputado Gil Pereira (PSD), ao lembrar as consequências da descontinuidade do trecho também para Montes Claros, no Norte de Minas.

O deputado Oscar Teixeira (PP) salientou que, além de preservar a cultura de localidades forjadas sobre os trilhos, o modal ferroviário oxigena a economia.

Para Ione Pinheiro, o Estado saiu prejudicado nas prorrogações antecipadas das concessões da Estrada de Ferro Vitória a Minas e da MRS Logística, e o mesmo cenário se avizinha. Ela questionou, por exemplo, o motivo da renovação antes do previsto de uma nova concessão que não seria vantajosa para Minas.

A deputada também se mostrou apreensiva com a guarda e vigilância dos ativos devolvidos pela concessionária, por falta de interesse econômico, e lembrou que a VLI já havia sido advertida e multada pela ANTT pelo abandono de trechos e por altos níveis de acidentes em suas linhas, o que descaracterizaria a necessidade de bons serviços para a prorrogação da concessão.

Por fim, ela ressaltou que as linhas descontinuadas precisam ser devolvidas no estado no qual a empresa as assumiu, em 1996, e não sucateadas, como se encontram.

Trechos priorizados dependem do planejamento do governo federal

Subsecretário estadual de Transportes e Mobilidade, Aaron Duarte admitiu que a possibilidade de devolução da linha Corinto – Porto de Aratu preocupa e que é preciso buscar uma solução. Ele ponderou, contudo, que a decisão de incluir ou não trechos no contrato não cabe ao Governo do Estado e que, por isso, se faz necessária uma composição com o Executivo federal.

Gerente de Estruturação Regulatória da ANTT, Cynthia Brayer reforçou a importância dessa abertura ao diálogo, uma vez que a definição dos trechos concedidos passa por uma pactuação do Ministério dos Transportes com a empresa concessionária, em acordo com as políticas públicas priorizadas pelo governo.

Apesar de a FCA defender que o trecho discutido não tem viabilidade econômica, a representante da ANTT explicou que a minuta é apenas um documento preliminar, o qual passará por consulta pública. O setor de gestão de contratos de ferrovias da agência também analisará os aspectos financeiros da concessão.

Patrimônio de Minas

Gerente-Geral de Relações Institucionais da VLI, Anderson Abreu destacou a relação da FCA com Minas Gerais, estado de origem ou destino de 40 milhões de toneladas transportadas por ano pela empresa.

Segundo ele, a nova concessão, por mais 30 anos, significa cerca de R$ 25 bilhões de investimento pela VLI, em grande parte em Minas Gerais. A malha sob responsabilidade da empresa passaria dos atuais 7,2 mil km para 3,5 mil km, em um processo de modernização para se tornar competitiva.

Quando à manutenção do trecho Corinto – Porto de Aratu, o gestor argumentou que a linha não tem capacidade para o transporte da carga demandada. O próprio Plano Estratégico Ferroviário do Estado estima em R$ 16 bilhões os investimentos necessários no trecho, observou.

Contudo, ele deixou em aberto possíveis mudanças na minuta da renovação. “O governo federal é o dono da caneta. Há de se ter uma composição de forças para competir com novas infraestruturas que estão sendo pensadas”, disse.

Ao final da audiência, a deputada Ione Pinheiro apresentou requerimentos para visitas a Brasília, com o objetivo de debater o processo de renovação antecipada da concessão da FCA com a presidência do Senado, o Ministério de Transportes e a empresa Infra S.A, responsável pelo planejamento e pela estruturação de projetos para o setor.

Audiência pública foi realizada no âmbito do Tema em Foco

O transporte ferroviário em Minas Gerais é o Tema em Foco escolhido pela Comissão de Transporte, Comunicação e Obras Públicas para o biênio 2023-2024. A audiência desta terça-feira (17) foi realizada no âmbito das discussões sobre o assunto.

A escolha do Tema em Foco pelas comissões da ALMG integra as ações do Assembleia Fiscaliza, iniciativa do Legislativo mineiro para monitorar a execução de políticas públicas pelo Governo de Minas Gerais.

 

Fonte: ALMG