Governo se arma para evitar calote em leilão
Apesar da redução das exigências em relação aos editais da BR-050 (DF-SP) e da BR-262 (ES-MS), o governo tem respaldo suficiente para prevenir eventuais prejuízos causados por parceiros privados. Especialistas ouvidos pelo DCI consideram "salutar" a posição do governo e acreditam que os editais, que serão publicados hoje, deverão atrair um número satisfatório de interessados. "Houve uma mudança muito importante ao aumentar a rentabilidade dos licitantes e flexibilizar a constituição do consórcio desse programa", opinou o professor do Centro de Estudos de Regulação e Infraestrutura da Universidade de São Paulo (USP), José Roberto Savoia. "O que nós vemos hoje é uma dificuldade dos licitantes de enxergar o cenário a longo prazo e sentir segurança", concluiu. Os receios dos investidores, entretanto, não se justificam, de acordo com o especialista. "Neste momento, por algumas variáveis macroeconômicas desfavoráveis, essa expectativa de risco aumentou entre os investidores, mas no Brasil nós ainda teremos um período grande de bons frutos para investidores em infraestrutura", disse. "Essa insegurança tem duas naturezas: uma delas é a demanda superestimada, que é um risco privado. As empresas tendem a aprimorar cada vez mais as estimativas para que não haja surpresas. Então, mesmo que o governo forneça o cálculo, elas também têm projeções próprias. E a segunda são os riscos políticos ou regulatórios para agentes privados", detalhou. Sobre a redução da exigência de garantias, Savoia destaca que o governo não terá prejuízos. "Todo contrato dessa natureza tem uma matriz de riscos, onde estão estabelecidos eventuais problemas das duas partes, do governo e do parceiro privado, e de que forma isso pode ser coberto por cada uma dessas partes. Quando você efetua uma matriz de risco, você atribui responsabilidades e pode prever as maneiras com que essas responsabilidades serão cobertas", explicou. O especialista em transportes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Luiz Afonso Senna, porém alerta para a necessidade de uma melhor avaliação da Taxa Interna de Retorno (TIR). "A elevação da taxa, além dos 7,2%, seria uma surpresa positiva, facilitaria a atração de novos investidores para os leilões", afirmou. O professor justifica que a TIR deveria estar relacionada à Selic (taxa básica de juros), hoje definida em 8,5% ao ano. "Normalmente a gente trabalha com a expectativa da taxa Selic, e quando a gente está trabalhando com uma taxa de juros da ordem de 8,5%, a gente tem uma defasagem [com a TIR]. O ideal seria o mais próximo da Selic", disse. De acordo com o último boletim Focus, divulgado semanalmente pelo Banco Central, a Selic deve encerrar o ano em 9,25%. Isso, de acordo com Senna, justificaria um TIR mais elevada. "A Selic está com uma taxa crescente e nós estamos com um taxa de retorno decrescente. Essa gap que causa um mal estar", explicou. Interessados Apesar da defasagem da TIR, Senna não acredita que isso seja um impeditivo de atração de interessados. "Imagino que deva haver licitantes, até porque eu diria que há uma grande expectativa para que o governo deslanche essas concessões, então o investidor está muito apreensivo com a expectativa de que o governo lance os editais o mais rápido possível", disse. Os principais interessados, de acordo com o analista da Coinvalores, Felipe Silveira, são as quatro maiores empresas de capital aberto do setor: CCR, EcoRodovias, Arteris e TPI, que devem entrar na disputa pelos leilões, não só da BR-050 e da BR-262, como dos outros trechos. Já com relação ao interesse dos demais investidores, entretanto, o analista ainda não arrisca projeções. "O que vai balizar muito o mercado é o apetite dos interessados na data do leilão", afirmou. Mudanças Depois do anúncio feito em maio pelo presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), Bernardo Figueiredo, sobre a elevação da Taxa Interna de Retorno (TIR) dos investidores, de 5,5% para 7,2%, o governo decidiu simplificar as condições de financiamento para as concessões de rodovias, na tentativa de atrair o empresariado para o primeiro leilão, que deve ocorrer em setembro. Segundo informações da Casa Civil, o governo simplificou as garantias exigidas das concessionárias nos financiamentos feitos pelos bancos públicos e decidiu exigir garantias distintas para cada fase do empreendimento. Até a conclusão das duplicações das vias, a partir do quinto ano da concessão, os recebíveis gerados pelo empreendimento poderão ser tomados com a única garantia do financiamento. Na fase pré-operacional, o vencedor do leilão terá que oferecer apenas um seguro-garantia e uma finca (proteção) correspondente a 20% do valor do empreendimento, o que, segundo o governo, vai onerar menos o projeto e permitir tarifas mais baixas. Ainda de acordo com a Casa Civil, as concessionárias terão apoio da Agência Brasileira Gestora de Fundos e Garantias (ABGF), que será responsável pelo seguro dos riscos não gerenciáveis e não seguráveis dos projetos. O empreendedor será responsável pelas perdas iniciais (20%). Os financiamentos terão prazo até 25 anos, com cinco anos de carência. O custo será de a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) acrescida até 2% ao ano, quando for feito por consórcios com bancos privados, segundo a Casa Civil. Para financiamentos apenas em bancos públicos, a TJLP será acrescida até mais 1,5% ao ano. Com relação às mudanças no modelo de financiamento, porém, a expectativa do analista da Coin valores contraria a projeção do professor do Centro de Estudos de Regulação e Infraestrutura da USP. Silveira espera apenas um impacto moderado no interesse do investidor, considerando o contexto econômico no exterior e no Brasil, com redução da expectativa de crescimento do País, alta da inflação e subida dos juros. Ao todo, serão nove lotes leiloados nos mesmos moldes, que somam 7,5 mil quilômetros. Fonte: DCI