Especialistas apontam urgência de planejamento do trânsito


Para levantar essa questão, a ALMG realiza, neste mês e em abril, reuniões para formatar evento sobre mobilidade urbana. Cláudia de Souza Rodrigues Oliveira tem a mobilidade urbana como uma de suas grandes preocupações. Isso decorre não só do seu trabalho na Comissão de Transportes de Ribeirão das Neves (RMBH), mas também porque esse tema afeta o seu dia a dia.

Cláudia gasta quatro horas diárias de seu tempo se deslocando para ir e voltar do bairro Liberdade, em Ribeirão das Neves, onde mora, até Betim, cidade em que trabalha. O cômputo desse tempo considera não só o trajeto percorrido pelo ônibus, mas o deslocamento de casa até o ponto e as horas de espera nesse local.

O secretário executivo do Ministério das Cidades, Alexandre Cordeiro Macedo, contabiliza que uma pessoa que consome quatro horas no transporte para o trabalho perde aproximadamente cinco anos de sua vida no trânsito. Para que o ir e vir seja mais eficiente, especialistas defendem um planejamento integrado do setor. Mobilidade urbana é definida como a capacidade de deslocamento de bens e de pessoas no espaço urbano para a realização de suas atividades cotidianas. O engenheiro e especialista em soluções para mobilidade urbana, André Luís Paraense, no artigo "A Harmonia Triádica das Soluções de Mobilidade Urbana para Cidades Inteligentes", afirma que, se a mobilidade é adequada, as pessoas conseguem trabalhar, fazer compras, estudar, cuidar da saúde, se dedicar à cultura e o lazer em um tempo considerado ideal, de modo confortável e seguro. Parece simples. Mas esse tema tem sido, cada vez mais, um entrave nas grandes metrópoles mundiais, não só por causa da grande necessidade já existente de deslocamento, mas também pelo crescimento constante dessa demanda, o que não é acompanhado por incrementos na infraestrutura. Diante disso, especialistas afirmam que uma das soluções para o problema é o planejamento em mobilidade urbana de maneira multidisciplinar, pois o transporte de pessoas envolve questões ambientais, sociais e econômicas.Esse planejamento se dá com a complementação de diversos tipos de transporte e também com a integração da mobilidade com a questão do uso e ocupação do solo, por exemplo. Para levantar essas questões, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realiza neste mês e em abril reuniões preparatórias para formatação do evento Mobilidade Urbana – Construindo Cidades Inteligentes, que deve acontecer no final deste semestre.

Nesta sexta-feira (22/3/13), acontece o quarto encontro, às 9h30, no Plenarinho I da Assembleia. Além disso, a instituição tem, ao longo dos anos, promovido eventos institucionais que permeiam o assunto da mobilidade urbana. Estatísticas - Os números endossam a necessidade de repensar a questão. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), há 6,4 milhões de deslocamentos motorizados por dia.

Estima-se que cerca de 5 milhões de pessoas circulam pelas 34 cidades da RMBH diariamente. Dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) mostram que Belo Horizonte tem 1,5 milhão de veículos e que, colocando todos esses automóveis enfileirados, daria mais de duas vezes a distância entre Belo Horizonte e Assunção, no Paraguai. Entre 2002 e 2012, o número de veículos registrados cresceu 105% na capital mineira. É como dizer que, a cada dia, 212 novos automóveis, caminhões, motocicletas e ônibus começaram a circular por aqui. No mesmo período em que a frota dobrou, a população aumentou apenas 6%.

Qualificação do transporte público é desafio. É consenso que o uso dos veículos de transporte individual sobrecarrega as vias e limita as possibilidades de deslocamento dos usuários do transporte público. Uma das soluções pensadas para o excesso de veículos é a qualificação do transporte público, por meio desse planejamento da mobilidade. Por comportar um número maior de passageiros, o transporte coletivo contribui para a redução dos automóveis e pode se articular aos modais complementares, como táxis, vans, bicicletas e até mesmo o deslocamento a pé. O secretário de Estado de Transportes e Obras Públicas, Carlos Melles, ressaltou, durante o Seminário Internacional de Mobilidade Urbana realizado no Crea-MG, como essa questão é emergencial. “Qualquer gestor público da atualidade tem que olhar para a questão do planejamento em mobilidade. Isso é unânime, é questão de fazer ou fazer”.

Já Alexandre Cordeiro, presente nesse seminário, também destacou a importância do planejamento em mobilidade. “Não resta dúvida de que o uso de automóveis é a forma menos eficiente de transporte e que a solução é a integração de vários tipos de transporte, incluindo o trem e o uso da bicicleta. Em uma faixa de três a quatro metros, caberiam 1.800 pessoas em carros, 3.700 pessoas em ônibus e mais de 6 mil se fosse em metrô”.

Para o secretário de Política de Transportes do Ministério dos Transportes, Marcelo Perrupato, a solução para a crise da mobilidade deve considerar o transporte mais abrangente, ainda que seja mais caro. Perrupato defende também a necessidade de se considerar nesse planejamento a questão do uso e ocupação do solo e também de logística. “Deve haver uma grande responsabilidade dos gestores públicos em perceber que criar sítios nas periferias não vai resolver o problema da mobilidade se essas pessoas tiverem que se deslocar para o trabalho, por exemplo”, afirma.

Assembleia Legislativa - O deputado Ivair Nogueira (PMDB), presidente da Comissão de Transporte, Comunicação e Obras Públicas da ALMG, relata que pensar em mobilidade urbana é pensar em planejamento integrado, unindo estratégias, exemplos bem-sucedidos e boa vontade política. Ele destaca que, nas reuniões preparatórias para o evento Mobilidade Urbana – Construindo Cidades Inteligentes, tem-se discutido vários pontos fundamentais, como política tarifária, concessão de linhas de ônibus, fiscalização das operações e das obras, inclusão social e bem-estar, enfim, os vários aspectos que envolvem o fácil acesso aos lugares, por meio de transporte eficiente e inclusivo, além de ambiental e economicamente viável. “Acredito que é mesmo a partir de uma discussão democrática, ouvindo os diversos segmentos e também a população, que o projeto de uma cidade, um Estado inteligente, terá chance de um futuro com menos problemas de mobilidade urbana”.

O presidente da Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da ALMG, Paulo Lamac (PT), ressalta que não há mais como falar em planejamento urbano sem incluir o planejamento de mobilidade. "O Plano de Mobilidade deve dialogar com o Plano Diretor e com as leis de uso e ocupação do solo. É indispensável o investimento em transporte público de qualidade, que convença o cidadão, pelo custo e pelo tempo de deslocamento, a deixar o seu automóvel em casa. O planejamento dos diversos modais, como ônibus, metrô, monotrilho e VLTs, deve pautar os investimentos públicos e parcerias público-privadas que se fizerem necessários, para que os municípios possam dispor da infraestrutura capaz de superar os desafios".

Para o deputado, que também coordena a Frente Parlamentar pela Reforma Urbana e vem dirigindo as reuniões preparatórias para o evento em formatação na ALMG sobre mobilidade, esses desafios são específicos de cada cidade, demandando diagnóstico e soluções únicas. Planejamento deve considerar também uso e ocupação do solo Cristian De Marchis, professor e responsável pela área de controle da gestão da empresa Benito Roggio e Hijos, que detém a maior parte das ações da concessionária do metrô de Buenos Aires, na Argentina, explica que, quando cresce a renda per capita, aumentam o número de viagens e também de carros, porque é ampliado o poder de compra, o que traz efeitos negativos para a mobilidade nas cidades. “É preciso mudar o modelo das cidades, planejar junto à mobilidade urbana a questão da moradia, da economia, do transporte de cargas. Sem planejamento, investimentos em transporte não têm o resultado esperado”.

Chistian lembra o caso do México, onde foram implantadas moradias em regiões distantes do centro. Segundo ele, cerca de 35% delas nunca foram habitadas. “Ilhotas de moradias dispersas causam alto custo ambiental, social e econômico. Precisamos pensar na ocupação dos municípios com solos mistos, agregando na mesma região comércio, indústria, atendimento médico e demais serviços indispensáveis. Dessa forma, cresce a qualidade de vida”. Mesma opinião tem a secretária-adjunta de Gestão Compartilhada da Prefeitura de Belo Horizonte, Maria Madalena Franco Garcia, que ressalta a importância de, nas discussões sobre mobilidade, extrapolar a questão da infraestrutura e abordar a integração com o Plano Diretor e a Lei de Uso e Ocupação do Solo.

O representante do Núcleo Jurídico de Políticas Públicas da PUC Minas, Frederico Guimarães, destaca que também é preciso considerar o meio ambiente nesse planejamento. “A cidade tem que ser humana. A inteligência tem que ser construída. Podemos formar nosso próprio modelo, que pense a questão do meio ambiente e da sustentabilidade. Acreditamos no planejamento integrado. Madri, pleiteando as Olimpíadas de 2020 (a cidade concorre com Tóquio e Istambul à sede dos jogos), apresentou dois eixos fundamentais: o meio ambiente trabalhado concomitantemente à mobilidade urbana".

Abastecimento - Já o economista e consultor de desenvolvimento e logística do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas do Estado de Minas Gerais (SETCEMG), Luciano Medrado, acrescenta a abordagem à logística nesse plano. “As pessoas se movimentam por cinco motivos: trabalho; busca por serviço e educação; saúde; lazer; e consumo. Isso só se efetiva com o abastecimento da origem ou do destino dessas pessoas. Ou seja, a mobilidade urbana é tema de logística urbana”.

Foto:ME/Portal da Copa/João Marcos Rosa/Nitro Fonte: Portal do Trânsito - SP