Conexão Legal debate insalubridade, periculosidade, regulamentação de “chapas” e seleção de talentos


O Sistema Transporte realizou, nessa quinta-feira (26), a quarta edição do Conexão Legal. O evento – fruto da parceria entre o SEST SENAT (Serviço Social do Transporte e Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte) e a CNT (Confederação Nacional do Transporte) – contou com a participação de cerca de cem pessoas no salão de eventos do Departamento Executivo Nacional do SEST SENAT, em Brasília (DF).

O encontro teve como objetivo oferecer a empresários, advogados e representantes dos setores de Recursos Humanos e Departamento Pessoal das empresas de transporte a oportunidade de esclarecer dúvidas sobre questões sensíveis da legislação trabalhista. Por ter ocorrido na capital federal, essa edição atraiu transportadores da região Centro-Oeste, além de profissionais de órgãos públicos federais interessados na temática.

A abertura foi realizada pelo presidente do Sistema Transporte, Vander Costa, que saudou os participantes e parabenizou a Organização por trazer personalidades relevantes para as palestras. “Eventos como esse são fundamentais para evitar a litigiosidade, ou seja, para minimizar a quantidade de ações trabalhistas. Precisamos mudar condutas, a partir do conhecimento da lei, para garantirmos o correto cumprimento”, concluiu.

Já o presidente do Conselho Regional do SEST SENAT do Centro-Oeste, Paulo Lustosa, classificou o evento como uma oportunidade de troca de conhecimento. “É um momento para discutir, avaliar e imprimir melhorias na nossa atividade”, concluiu.

Lei ou acordo: o que vale para a Justiça Trabalhista?

A primeira palestra do dia, intitulada "Negociado x Legislado", foi conduzida pelo ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Sérgio Pinto Martins. O objetivo foi esclarecer os limites do que pode ser acordado diretamente entre o sindicato dos trabalhadores e a empresa e os direitos garantidos por lei, que não podem ser diminuídos.

O ministro destacou que essa dúvida é antiga, presente até em Constituições do Brasil anteriores, mas ganhou relevância com a Constituição atual, que reconheceu os acordos coletivos como instrumentos válidos. No entanto, como ressaltou, nem tudo pode ser objeto de negociação, devido às previsões estabelecidas na Constituição Federal e nas normas trabalhistas. 

“Qualquer matéria que implique redução de direitos indisponíveis do trabalhador não é válida. Se isso foi incluído no acordo, existe a possibilidade de questionamento judicial. O cerne da questão está no Tema nº 1.046, relatado pelo ministro Gilmar Mendes, que trata da validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não assegurado constitucionalmente”, explicou Sérgio Martins.

Regulamentação da atividade de "chapa" de caminhão

Ainda na parte da manhã, o juiz Rogério Neiva abordou o tema do reconhecimento de vínculo empregatício com os ajudantes de caminhão, conhecidos popularmente como “chapas”. Esses trabalhadores, que atuam de forma informal carregando e descarregando caminhões, oferecem seus serviços em rodovias ou cidades, independentemente do tipo de carga.

Muitas transportadoras recorrem aos "chapas" para realizarem serviços pontuais, especialmente em situações de demanda inesperada ou elevada. Embora exista uma lei de 2009 (Lei nº 12.023) que regulamenta o trabalho avulso com movimentação de mercadorias, ainda não há consenso sobre o tema na Justiça do Trabalho. 

“O assunto está para decisão do TST. Se for validado, é provável que surjam inúmeras ações pedindo o reconhecimento do vínculo. Caso isso prospere, as empresas vão precisar atuar de modo preventivo e buscar alternativas para tentar amenizar os impactos da litigiosidade”, alertou Rogério Neiva.

Adicional de periculosidade

No período vespertino, foi abordada uma questão que gera muitas dúvidas entre os empregadores do setor de transporte: o pagamento do adicional de periculosidade para motoristas que acompanham o abastecimento do veículo que conduzem. O ponto central é o possível risco ao qual o trabalhador estaria exposto, como explosões durante o abastecimento. Esse tema foi amplamente discutido pelo advogado Matheus Corrêa da Veiga.

Outra situação que suscita dúvidas sobre o pagamento do adicional envolve o motorista que permanece de sobreaviso ao pernoitar no caminhão. Segundo o advogado, além de estar à disposição da empresa, ao permanecer no veículo, o motorista está sujeito a riscos, como assaltos em estradas ou pontos de parada. 

“O art. 193 da CLT estabelece que somente a trabalhadores permanentemente expostos a materiais inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado podem receber os 30% extras no salário. Isso também se aplica à segurança pública, pois existe risco à sua integridade física. Mas, como vimos na jurisprudência do TST, existe precedente para o pagamento, inclusive no caso de contato intermitente com o abastecimento”, destacou Matheus Corrêa da Veiga.

Insalubridade na condução de veículos

Já a palestra do ministro Alexandre Ramos, do TST, focou no direito à percepção de adicional de insalubridade em decorrência da existência de níveis aumentados de exposição a calor, ruído e vibração. Existe uma grande discussão acerca desse tema, em razão das condições de trabalho aos quais os motoristas profissionais podem estar submetidos, como a temperatura elevada no interior dos veículos causada pelo sol. 

Certos ônibus e caminhões podem não ter ar-condicionado e emitir elevado ruído dos motores. Há súmulas do TST que versam sobre a temática, inclusive com métricas para níveis de aceitação de calor e de ruído baseadas em parâmetros técnicos e de saúde, as quais devem ser seguidas por todos.

“Cabe ao empregador fornecer o EPI, fiscalizar o cumprimento e buscar prover todas as necessidades para elidir ou minimizar os impactos da insalubridade na saúde do trabalhador. É preciso ter cuidado ao decidir para não se gerar um passivo imenso para o setor de transporte, pois isso pode causar imensos problemas para o empregador que sempre seguiu corretamente as leis e normas regulamentadoras”, explicou Alexandre Ramos.

Habilidades para selecionar os melhores profissionais

Após uma série de temas relevantes, o Conexão Legal encerrou com um workshop enriquecedor para os participantes. Conduzido pelo advogado, headhunter e palestrante Raul Cury Neto, o último momento foi dedicado ao ensino de técnicas de recrutamento e avaliação do comportamento de candidatos.

Cury Neto interagiu com o público, fez perguntas e compartilhou estratégias para identificar características comportamentais adequadas a cada cargo. Segundo ele, "as pessoas são contratadas pelas competências técnicas, mas são demitidas pelo comportamento" – uma realidade que não está necessariamente ligada à senioridade do profissional. 

“O recrutamento sempre foi fundamental para o crescimento e sucesso das organizações. Mas, se, antes, só se contratava por hard skills (habilidades técnicas), hoje as empresas também procuram profissionais com soft skills (habilidades comportamentais). O que mais falta hoje, no mercado, são pessoas com soft skills adequadas para os cargos”, concluiu.

Saiba mais sobre o Conexão Legal

O Conexão Legal é um evento realizado pelo SEST SENAT com o apoio da CNT para orientar profissionais dos setores Jurídico, de Recursos Humanos e de Departamento Pessoal sobre temas relacionados ao Direito do Trabalho, com impactos na rotina, na organização e nas finanças das empresas do transporte. Para isso, autoridades e palestrantes de renome foram convidados para apresentar temas fundamentais causadores de judicialização.

Em seu ano de lançamento, fecha o ciclo de 2024 com quatro eventos realizados. Locais estratégicos foram selecionados para atender colaboradores de diversas regiões do país: Santo Amaro (SP), Belo Horizonte (MG), Fortaleza (CE) e Brasília (DF).

Confira a playlist com vídeos das edições passadas.