Concessões, PPPs e o Futuro - 2ª Parte


Na primeira parte deste artigo, procurei demonstrar como são importantes os investimentos em infraestrutura para que o Brasil possa experimentar um ciclo longo de crescimento econômico e de desenvolvimento social, já que as nossas carências nessa área acabam funcionando como um teto, a limitar até mesmo os “voos de galinha” que às vezes temos dado. Demonstrei também que esses investimentos são vultosos e inadiáveis; e que eles precisam ser feitos num momento em que os recursos públicos são insuficientes para atender prioridades, ainda mais sensíveis, como saúde, educação, segurança pública, saneamento básico etc.

Não foi por outro motivo, aliás, que praticamente toda a segunda fase do Programa de Investimento em Logística – PIL, lançada pelo Governo Federal em 9 de junho último, foi concebido para ser executada pela iniciativa privada, em regime de concessão.

São inúmeras intervenções em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, que totalizam quase R$ 200 bilhões (20% do total identificado pelo “Plano CNT de Transporte e Logística – 2014”), a serem realizados no período de 2015 a 2018. Esta foi, aliás, uma extraordinária evolução para um Governo que tinha sérias dificuldades de aceitar esse tipo de parceria. É muito instrutivo, aliás, ouvir o que disseram, na ocasião, a presidente Dilma e os ministros Levy e Nelson Barbosa: emhttp://g1.globo.com/economia/noticia/2015/06/nova-fase-de-programa-preve-r-1984-bilhoes-para-infraestrutura.html.

Trata-se de uma manifestação de realismo político e do abandono de velhos clichês ideológicos, forçada, é verdade, pela necessidade dramática de recuperar o nível de investimento, diante das crises gêmeas – econômica e política – que tem matrizes diferentes, mas se retroalimentam e são diariamente agravadas pelas revelações da Operação Lava Jato. A Petrobrás e as grandes empreiteiras viram-se na contingência de frear abruptamente seus investimentos. Consta que essa paralisia atinge mais ou menos 1/3 dos investimentos públicos e privados no país.

Ora, um forte programa de obras de infraestrutura, além da função precípua de eliminar os gargalos que impedem o crescimento do país, tem nítido caráter anticíclico, gerando novos empregos e encomendas em larga escala, animando a economia e, neste momento, ajudando também a salvar algumas das maiores empreiteiras do país. Para quem se escandalizar com esta minha última afirmação, vou logo avisando que não compactuo com qualquer forma de impunidade. O combate sem tréguas à corrupção é fundamental e corresponde a um justo anseio nacional. Mas não se pode perder de vista o princípio universal de que a pena não deve ultrapassar a pessoa do criminoso. Assim, a punição, absolutamente necessária, dos eventuais culpados entre os gestores das empresas envolvidas no “Petrolão”, bem como a de seus parceiros (ou comparsas) do setor público – e mesmo as penas aplicáveis às próprias empresas, nos termos da recente “Lei Anticorrupção” –, não devem chegar ao extremo de inviabilizá-las.

Além do mais, o Brasil não pode abrir mão do know how e da capacidade técnica acumulada por essas organizações, que estão entre as maiores e melhores do mundo em construção pesada e em grandes obras públicas. Se acontecer a desarticulação e, no limite, a dissolução delas, desaparecerão milhares de empregos de qualidade e perderemos a capacidade de tocar, simultaneamente, as centenas de obras que compõem o PIL, já referido.

Em entrevista recente, o presidente do BRADESCO, Luiz Trabuco, diz que uma retomada de crescimento somente deverá ocorrer a partir de meados do próximo ano e “será puxada pelos investimentos em infraestrutura” (Folha de São Paulo, 8/8/15, pág. A-19). Ver mais emhttp://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/08/1666207-para-presidente-do-bradesco-crise-e-grave-e-solucao-exige-grandeza.shtml. Se o prognóstico dele estiver certo – e acho que está –, o eventual naufrágio do PIL, tragado pelo tsunami da Lava Jato, representaria, além de tudo, a perda da nossa “bala de prata”.

Vejo algumas pessoas, com a visão turvada pela radicalização do debate político, torcendo para que isso aconteça, porque supõem que este seja apenas mais um fator de desgaste para o Governo. Na verdade, se o agravamento do quadro político e o consequente clima de insegurança para os negócios não nos permitir avançar e ampliar consideravelmente o programa de concessões e parcerias público-privadas – na linha do previsto no PIL e, a longo prazo, na extensão preconizada pelo “Plano CNT de Transporte e Logística” – isso será um enorme problema para o país como um todo. Pior do que perder o grau de investimento será perder o status de nação emergente; e de sermos melancolicamente devolvidos à condição de país subdesenvolvido.

Para além da questão política, há ainda a tendência profundamente equivocada, a meu ver, inclusive entre empresários, de demonizar a concessão de obras e serviços públicos, chegando mesmo à defesa de quebra de contratos, como se isso fosse a coisa mais natural do mundo. Tratarei dessas e de outras questões, ainda muito mal discutidas e compreendidas entre nós, na terceira e última parte deste artigo.

(continua)

Fonte: Geraldo Vianna é advogado, consultor em Transportes, ex-presidente da NTC&Logística e Diretor da CNT.