BR-381: descaso ou incompetência?


Foram mais de dez anos de elaboração de um projeto cuja execução é reivindicada há mais de três décadas. Esse foi o período que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) levou para fazer o projeto executivo de duplicação da BR-381, no trecho conhecido como "rodovia da morte", que liga Belo Horizonte a Governador Valadares, no Vale do Rio Doce.

Em novembro do ano passado, os tão sonhados editais dos primeiros lotes a serem duplicados foram lançados. Porém, mal chegaram a ser divulgados e dois dos três documentos foram suspensos (0654/1200 e 026/1300). O de número 791/1200, em aberto, tem certame previsto para o próximo dia 26.

O motivo para a suspensão, segundo o órgão, é que as empresas interessadas querem informações mais detalhadas a respeito da obra. Isso porque os editais da BR-381 são de preço global (menor preço) no Regime Diferenciado de Contratação (RDC). O regime prevê que a empresa que assumir a obra por um determinado valor não poderá mais tarde alegar que houve imprevistos e que a intervenção, por um motivo ou outro, custará mais aos cofres públicos. Caso aconteçam tais imprevistos e os gastos cresçam, é a empresa contratada que terá de arcar com esse custo a mais.

"Por conta desse modelo de contratação, o detalhamento do projeto é imprescindível, ainda mais em se tratando da BR-381, com tantas curvas, topografia irregular e grande tráfego de veículos. Trata-se de uma obra que exige um nível de detalhamento maior que outras estradas", analisa o mestre em Engenharia de Transportes Márcio Aguiar, professor da área na Universidade Fumec.

Aguiar teve acesso ao projeto executivo elaborado pelo Dnit. "Não há dados que permitam às empresas um cálculo preciso não só dos custos, como também do tempo necessário para todas as operações. Sem essas informações, a empresa assume riscos que podem levá-la à falência, com a conseqüente interrupção da obra. As construtoras agiram corretamente em solicitar ao órgão que acrescente mais informações", explica.

Detalhamento - O representante de uma grande construtora, que está entre as que solicitaram o detalhamento do projeto executivo ao Dnit, enumerou algumas falhas do documento. "Há por exemplo vários trechos da nova estrada que coincidem com a antiga. Nesses trechos, muitos de curva, o projeto executivo prevê a necessidade de retificação e adequação. No entanto, não considera, por exemplo, o tempo de transporte, informações precisas de aterramento e tráfego. Até para atravessar de um lado para o outro da estrada é complicado", exemplifica.

O representante da construtora acrescenta que há informações no projeto do Dnit impossíveis de serem checadas. "Fizeram um projeto nos moldes de uma rodovia simples, considerando os mesmos fatores que se tem, por exemplo, em uma rodovia de Goiás, onde a topografia é plana, calculando preço por quilômetro, conforme a tabela do Dnit. Sendo assim, o projeto finalizado não está no nível de uma obra que a BR-381, um caso excepcional, com topografia peculiar e traçado fora do comum, exige. A rodovia tem uma média de duas curvas por quilômetro. O risco é muito grande".

Outro erro, destacado por ele, está relacionado às desapropriações ao longo da rodovia. "Como é que se lança um edital sem atinar para questões como essa antes?", questiona.

O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Pesada no Estado de Minas Gerais (Sicepot-MG), Alberto Salum, disse que já esperava esse tipo de imbróglio desde o anúncio dos editais de duplicação da rodovia, no ano passado. "O governo mudou a modalidade de contratação de preço unitário para preço global, e o projeto havia sido elaborado para uma outra realidade de licitação. As construtoras estão corretíssimas, pois se há um projeto ‘meia boca’, ele vai gerar aditivo. Aí vem o TCU (Tribunal de Contas da União) e fala que a construtora está tentanto superfaturar a obra" afirma.

Questionado sobre as falhas apontadas pelas construtoras nos editais durante uma semana, o Dnit não respondeu à demanda da reportagem, assim como não apontou um novo prazo para a retomada do processo. O órgão, por meio de sua assessoria de imprensa, limitou-se a divulgar a atual situação de cada edital, informações já conhecidas e disponíveis no site da instituição.

Prejuízos - Enquanto a tão sonhada duplicação da "rodovia da morte" não tem prazo para sair do papel, os acidentes fatais continuam freqüentes no trecho, com uma média de 1,3 morte a cada dois dias e 27 acidentes diários, conforme dados de 2011 e 2012 divulgados pela Polícia Rodoviária Federal.

Isso sem contar os prejuízos econômicos. " um trecho que onera o custo logístico e reduz a competitividade das empresas brasileiras", avalia Luciano Medrado, consultor técnico da Federação das Empresas de Transportes de Carga do Estado de Minas Gerais (Fetcemg).

Fonte: Diário do Comércio