Insegurança nas estradas custa R$ 16 bi por ano


O prejuízo do Brasil com as mercadorias roubadas no transporte rodoviário de cargas está perto de R$ 1 bilhão por ano, conforme estimativas de especialistas do setor, feitas a partir dos dados que são contabilizados nos órgãos de segurança pública. Além disso, 9% do valor do frete reflete custos com segurança e gerenciamento de risco, algo como R$ 16 bilhões por ano, pelas contas da Pamcary, gerenciadora de riscos especializada em transporte. "Roubo de cargas é negócio de quadrilha organizada, porque ninguém rouba a carga de um caminhão se não tem receptador seguro para ela", diz Flávio Benatti, responsável pela sessão de cargas da Confederação Nacional dos Transportes (CNT). Há mais de 20 anos o setor estuda e analisa a questão, havendo gestões de diversas formas na área de legislação e segurança pública. A Lei Complementar 121, sancionada em fevereiro de 2006, é um exemplo. "O texto prevê a criação de um sistema de inteligência para obtenção de dados cruzados nas diversas instâncias de segurança pública, federal, estaduais e municipais, mas ficou sem regulamentação, até hoje", lamenta Benatti. Para se proteger, e manter a atividade em funcionamento, as empresas adotam custosos procedimentos preventivos. "Além do custo, os esquemas de segurança obrigam a paradas e desvios de rota que impactam a otimização do uso do transporte e, consequentemente, redução da rentabilidade da operação", diz Benatti. A região Sudeste é a mais afetada com a insegurança, concentrando 76% das ocorrências, seguida pela região Sul, com 9,4%, Nordeste 8,4% e Norte, com 1,8%. As cidades mais afetadas são São Paulo e Rio de Janeiro. Segundo a Pamcary, que monitora 6 milhões de viagens por ano, com atendimento a 8 mil ocorrências, de mais de quatro mil clientes, as capitais concentram mais da metade dos prejuízos com cargas roubadas dos estados. Em São Paulo, onde ocorrem 65% dos prejuízos, 32% concentram-se na capital. "O maior número de ocorrências acontece nas áreas urbanas, mas o prejuízo é maior nas ocorrências rodoviárias", diz Darcio Centoducato, diretor de Gerenciamento de Risco da Pamcary. Manoel Sousa Lima Jr., presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Carga de São Paulo e Região (Setcesp), afirma que o roubo de cargas é, de longe, o mais grave problema do setor. "Essa é a verdadeira agonia das empresas", sintetiza. Segundo ele, o bandido da linha de frente, que rende o motorista, é apenas o início da operação. O esquema pesado é o que distribui as mercadorias até as lojas, onde são misturadas às lícitas. Ele destaca que a tecnologia de rastreamento já permite à fiscalização comprovar o crime, no caso da ação policial no canal de venda. "Falta vontade política para a intervenção", afirma. Para o coronel Paulo Roberto Souza, assessor de segurança da NTC&Logística, que reúne transportadoras de todo o Brasil, não há uma resposta pública integrada. "As medidas são isoladas, sem amparo institucional amplo", diz, destacando que não há lei que leva ao que ele chama de "perdimento de bens" dos criminosos, o que poderia minar o sistema criminoso de receptação de cargas roubadas. Ele conta que há menos de dez anos houve uma tentativa de implantação no Brasil de algo similar à Lei de Descomiso, da Argentina. No país vizinho, há a ameaça de interdição e de auditoria geral dos estabelecimentos comerciais pegos com um item roubado em seu estoque. O pressuposto é que se há um artigo roubado, tudo pode ser roubado, e isso vale para todas as filiais, em caso de rede de lojas. A empresa corre o risco de ficar meses sem poder funcionar, sob auditoria. Mesmo com resultados animadores na Argentina, de queda de 60% a 70% no roubo de carga depois da aplicação da lei, a avaliação prevalecente no Brasil é de que a lei argentina é muito dura. Em julho passado, uma alteração na legislação brasileira de lavagem de dinheiro, prevista na Lei 12.683, abriu espaço para o "perdimento dos bens" pelo crime de roubo de cargas. "É algo no sentido de coibir o roubo, mas ainda muito tímido, diante da gravidade do problema", diz Souza.

Fonte: Jornal Valor Econômico